segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Sem parto!


Sagaz, bem informado e totalmente antenado com as tendências musicais contemporâneas, Parteum é sem dúvida um dos mais respeitados – e talentosos - nomes do Rap Nacional.

O encontrei, ou melhor, o procurei, na noite de sexta-feira (30), durante um workshop sobre Produção Musical, ministrado por ele próprio, e que estava rolando na Coletivo Galeria, em Pinheiros.

Durante nossa breve conversa, Parteum se mostrou (e demonstrou durante o workshop) um cara bem amadurecido musicalmente. Exímio conhecedor, e estudioso, da produção musical na era digital.

Ainda na Galeria, ao som do Dj Suissac, Parteum não impôs barreiras, rampas ou corrimãos para que marcássemos uma entrevista (a primeira de O Melenick – 2º Ato).

E a estréia não poderia ter sido em melhor estilo!


Nome?
Fábio Luiz

Porque Parteum?
Se me lembro bem, minha primeira rima dizia algo como: Não vejo problema algum, Parte 1, no microfone, na fome, venho pra inovar... Depois descobri que Parteum siginifica parto em latim, e só troquei o numeral pelo extenso e juntei as palavras. Fazer música é sempre parto.

Qual a importância do Skate na sua formação como homem e musico?
Se não fosse o skate, eu seria o cara mais infeliz do planeta. Como você explica para uma garoto negro de periferia que o mundo não é tão grande assim, senão o colocando em pistas com seres de diferentes classes sociais e crenças. As viagens que fiz pelo Brasil e afora me fazem perceber o meio de uma outra maneira. Meus melhores amigos andam de skate até hoje. Na música as amizades se dão de outra forma, os interesses são outros... Na real, falar de amizade e interesse na mesma sentença já me parece torto.
O Skate me ensinou a buscar meios para viver do que acredito, me expressar de verdade. A música é um desdobramento da experiência acumulada no Skate.

Mas e ai, continua andando?
Sim, estava ao telefone agora mesmo com o Fabio (Chupeta). Quando passei por um processo de imersão em estúdio, em 2002, 2003, ele nunca me deixou parar de andar. Já chegou a aparecer com um skate montado na porta de casa e falar: Tem estúdio hoje? Dane-se! Hoje você vai andar de skate.

Fale sobre a sua nova mixtape "Magus Operandi"? Por que uma mixtape e não um CD?
Na verdade, essa é a minha sexta mixtape. Eu sempre dou um jeito de colocar meus trampos na rua, não penso muito na sazonalidade do mercado e tudo mais. Um artista que vende 4.500 peças de um disco não importa muito para o mercado. Tive toda a ajuda da Trama no lançamento do meu primeiro álbum solo, Raciocínio Quebrado, mas já sabia que existia uma linha entre o investimento proposto e os números. Números não mentem.
Costumo dizer que as mixtapes são as portas do estúdio entreabertas, já o álbum tem a finalidade de contar a história de um período na vida do artista, fechar um ciclo até. Eu acredito que os grandes álbuns sejam criados a partir dessa premissa.
Penso que essa é a terceira mixtape, das seis que já lancei, com características de álbum. Parte da experimentação com instrumentos acústicos, presente no meu próximo álbum, já aparecem na mixtape. Magus Operandi, logo mais nas ruas!

Assim como nos demais ramos de atividade profissional, você concorda que o Rap também tem as suas panelas? Com quem você anda, quem são seus parceiros (músicos ou não) mais chegados?
Eu não acredito em panelas, na real ando com as pessoas que me respeitam, e tem uma visão parecida com a minha. Já andei pelos mais diversos círculos fazendo música. Nunca imaginaria escrever uma canção (My Rules) para o Ed Motta, por exemplo, ou remixar Tom Zé. Meus parceiros mais constantes são Secreto e Suissac, sem dúvida. Falo bastante com Kamau, Espião, Rodrigo (Mamelo), mas faço pouca música com eles. Produzi duas faixas no disco do Kamau, uma para o Mamelo recentemente e tem uma produção minha no disco novo do Espião. Falo de música com o Maurício Takara quando nos encontramos... Acho doido o trampo do Guizado. Gosto do flow e das letras do Rincon Sapiência, gosto da Luana rimando também, da Stephany do Simples. Essa pergunta é injusta, ao menos dez outros nomes vão ficar de fora.

Como é a sua relação com o seu irmão (Rappin Hood), vocês se falam com freqüência? E os trampos, produzem coisas juntos?
A melhor possível. Acho que até colaboramos pouco um com o outro. Acabo de remixar uma faixa da Quadrilha, um grupo formado por ícones do Hip-Hop Brasileiro: Rappin Hood, KL Jay, Hébano (Potencial 3) e Xis. Tem essa parada de irmão mais novo e mais velho, mas sei que ele vibra com cada acerto meu na loucura do mundo da música. Afinal de contas, era com ele que ouvia Slick Rick, Public Enemy e De La Soul em 87, 88.

Qual a sua formação musical. Onde estudou?
Toquei em fanfarras durante algum tempo, isso quando eu tinha 10, 11 anos. Comecei a disputar campeonatos de skate e desencanei da música. Sempre gostei de bateria, passava horas imitando os ritmos que ouvia nos sons do The Police, no Funk de George Clinton (Parliament/Funkadelic) em casa. Ouvia Tião Carreiro e Pardinho com meu pai, Standards da Motown com minha mãe... Aida de Verdi nos ensaios da fanfarra. Nunca passei fome de música nessa vida.
Só fui me interessar pela música, além das aulas de divisão rítmica, quando passei a levar minha irmã às aulas de piano. Isso mudou a maneira de perceber as melodias e harmonias. Até tínhamos um piano em casa, um pouco antes do piano chegar, comprei um teclado para minha irmã quando recebi meu primeiro 13º.
Em 1998 conheci o Espião (Rua de Baixo), aprendi a programar timbres nos teclados. Comprei uma Groovebox 505, enchi o saco do Beto Villares (Salve, Mestre!) e fui aprendendo essa parada de gravação e criação. Preciso falar do Vander Carneiro do Atelier Studios, um dos dos melhores engenheiros de som do Brasil. Tenho bons amigos e bons professores nesse jogo maluco. Faço aulas de piano com a Joana Brito, mas sei que não sou um bom aluno. Desculpa, Joana!!!

Você acha que as pessoas que fazem rap hoje no Brasil (músicos e produtores) já aprenderam a enxergar a musica como negócio? Ou ainda tem muita gente ganhando dinheiro em cima dos rappers e produtores no nosso país?
Não, mas estamos todos aprendendo. O modelo de negócio do mercado fonográfico está mudando. Não diria reinvenção, mas tudo está meio esquisito. Hoje, conto muito mais com patrocinadores de roupa e tênis para botar meus projetos na rua. Meu deal com a gravadora é bem mais parecido com sociedade mesmo, se bem que na Trama, é sentar com o João, ser sincero e pensar nas possibilidades. Nem sei como seria minha carreira se tivesse assinado um licenciamento, ou mesmo um contrato de cessão de fonogramas, com uma major.

Notadamente você e um cara que conhece muito bem o assunto Produção Musical. Como adquiriu, e continua adquirindo, conhecimento. Onde busca informações para produzir seus trabalhos?
A internet é um vasto oceano, não é profundo, mas é um oceano. A partir das informações que leio em sites de tecnologia, propriedade intelectual, blogs de advogados da área autoral, músicos, arranjadores e compositores, eu vou revendo o que aprendi fazendo a correria com o grupo. Minha relação com a Trama me ajuda até hoje.
Já para produzir meus sons, tento não prestar atenção no que é atual ou antigo, produzo o que minha cabeça manda. É lógico que tudo o que faço tem um forte elo com o que cresci ouvindo: Nas, A Tribe Called Quest, De La Soul, Pharcyde, EPMD, Os Metralhas, Possemente Zulú... mas minha própria loucura, e o ritmo com que lido com meus afazeres, livros, filmes, formam as composições.

-A quantas anda a sua carreira, como divide os trampos de produção, os ensaios e apresentações do Mzuri Sana e a carreira solo? Qual a sua prioridade no momento?
Passei 7 meses desse ano sem me apresentar. Na real, acho que fiz 2 apresentações da mixtape do Kléber e só. Agora retomei os shows pra divulgar a mixtape e o DVD do Mzuri que, com a permissão divina, será lançado em breve. Gostaria de ter uma prioridade em minha carreira, mas só primo por melhores timbres, acordes... o Mzuri Sana fez dez anos agora em outubro. Que venham os próximos dez.

Quem integra e o que significa Mzuri Sana?
Mzuri Sana significa muito bom em Swahili. Se alguém te pergunta Habari yako? Você responde Mzuri Sana. Tipo: E aí, tudo bem? Tudo bom, tudo tranquilo. Conversando com meu avô materno, pegando informações que um tio falecido coletava, cheguei ao nome da fazenda onde meus antepassados trabalharam na região de Dois Córregos. É quase certo que eles falavam algum dialeto derivado do Kiswahili ao chegar aqui. Devem ter vindo de algum lugar entre Kenya e Mozambique. Mzuri Sana = Parteum + Secreto + Suissac.

Planos para 2009?
Lançar meu segundo álbum, começar a produção do terceiro álbum do Mzuri, pegar um outro longa pra fazer a trilha... Eu tenho um monte de planos, a execução é lenta, mas idéia é o que não falta. Me divertir mais, trabalhar um pouco menos.


Como as pessoas podem fazer para adquirir a sua mixtape?
A grande maioria baixa da internet mesmo, é claro que eu agradeço quem as adquire nas lojas do centro de SP. Algumas lojas até despacham para outros estados e exterior via correio. Mandem emails para management@mzurisana.com
e indicaremos uma loja ou distribuidor, sem problema.

Considerações finais. Gostaria de deixar um recado ou falar algo que não foi perguntado?
Obrigado pela consideração, Nabor. Vida longa ao blog! Magus Operandi logo mais nas ruas. Mzuri Sana ao vivo na Praça da Sé no dia 20, e que nossos sucessos não sejam a perdição de outros. Axé!

Informações:
Parteum
http://www.parteum.com/
http://www.mzurisana.com/